FBG COVID-19 GASTROENTEROLOGIA – 10ª edição

Avaliação da distância física, máscaras faciais e proteção ocular para prevenir a transmissão pessoa a pessoa do SARS-CoV-2 e COVID-19. Revisão sistemática e meta-análise. 

Bem conduzido trabalho liderado pela McMaster University, Canadá, com objetivo de investigar a distância ótima entre as pessoas e o papel efetivo do uso de máscaras e proteção ocular para prevenir a transmissão viral.   

Foram analisados os dados obtidos em diferentes trabalhos, sem restrição linguística, sobre informações de SARS-CoV-2 e betacoronavírus que provocam síndrome respiratória aguda grave e síndrome respiratória do Oriente Médio, procedentes de 21 fontes padrões da OMS e COVID-19. A partir dos prontuários, foram rastreados os registros, extraídos dados e avaliados os riscos e eventuais vieses dos parâmetros da análise. 

A revisão identificou 174 estudos observacionais em 16 países, constituídos por ensaios não controlados e não randomizados e 44 estudos comparativos com padrões cientificamente relevantes (25.697 pacientes). Em conclusão, foi considerado que os achados suportam a importância de distância física de 1m ou mais. Estimativas quantitativas são relevantes para modelos de política comportamental e, neste sentido, os achados indicam que os sistemas de saúde públicos e privados devem ser informados também sobre o uso ideal de máscaras faciais, respiradores e protetores oculares.   

Destaca-se ainda que são necessários grandes ensaios randomizados para melhor se caracterizar os achados acima, embora a revisão sistemática a partir das evidências atualmente disponíveis forneça orientações satisfatórias. 

Chu D K et al. Lancet 2020;395:1973-1987. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)31142-9.

COVID-19 e endoscopias gastrointestinais 

Um novo coronavírus apareceu em dezembro de 2019, na cidade chinesa de Wuhan, denominada síndrome respiratória aguda grave coronavírus-2 (SARS-CoV-2) e a enfermidade foi chamada de coronavírus-2019 (COVID-19). A infecção devida ao vírus se disseminou exponencialmente através da China e para cerca de 205 países.   

Trabalhos anteriores de casos isolados da infecção foram descritos tendo os endoscópios atuando como possíveis vetores. Embora organismos resistentes multidrogas tenham sido relatados de se disseminar pelos endoscópios, poucos casos de viroses como hepatites B e C têm sido observados na literatura. A COVID-19 é predominantemente disseminada pela transmissão de gotículas, embora evidências recentes tenham demonstrado sua presença nas fezes e a transmissão fecal-oral possa também ser possível. Não está bem estabelecido se a COVID-19 pode ser transmitida por endoscópios, mas teoricamente isso pode ocorrer devido ao contato com as membranas mucosas e fluidos corporais. 

As endoscopias gastrointestinais envolvem contato íntimo com os conteúdos orais e colônicos, expondo o pessoal técnico a secreções respiratórias e orofaríngeas, o que pode aumentar o risco de contaminação e contribuir para a transmissão viral. Tendo em vista tais riscos, a maioria das sociedades gastrointestinais têm chamado a atenção para a reprogramação dos procedimentos não urgentes e realizar somente aqueles emergentes e urgentes, baseados na necessidade clínica.  Além disso, é recomendada a avaliação clínica/laboratorial dos candidatos ao exame endoscópico.   

Uma vez que a pandemia de COVID-19 continua a se expandir pelo mundo, é muito importante a estratificação de risco dos indivíduos candidatos ao exame endoscópico. O uso de dados objetivos para estes pacientes e o adiamento dos procedimentos eletivos diminui o risco da infecção e pode contribuir para a redução da disseminação viral. A aderência a procedimentos de desinfecção de alto padrão, manutenção de distância e cuidadosa higienização das mãos são plenamente justificados. 

Perisetti A et al. Digestive endoscopy, 2020. doi: 10.1111/den. 13693.

Manifestações e prognóstico de envolvimento gastrointestinal e hepático em pacientes com COVID-19:  revisão sistemática e meta-análise 

O presente trabalho baseou-se em estudos publicados entre 01/01/2020 a 04/04/2020 em fontes confiáveis como Pubmed, WHO, Web of Science.  Foram analisados 35 trabalhos, incluindo 6.686 pacientes que preencheram os critérios de inclusão. Vinte e nove estudos (n=6064) referiram a sintomas gastrointestinais no diagnóstico de pacientes com COVID-19 e a prevalência de comorbidades digestivas foi de 4%, enquanto a prevalência de sintomas digestivos foi de 15% (três principais manifestações: diarreia, vômitos, perda de apetite). 

A prevalência de funções hepáticas alteradas (12 estudos, n=1267) foi de 19%. A análise do subgrupo de pacientes graves demonstrou maiores índices de dor abdominal e alterações funcionais hepáticas mais evidentes, incluindo elevações de ALT e AST. 

Pacientes pediátricos com COVID-19 apresentaram prevalência de sintomas gastrointestinais semelhante à apresentada por pacientes adultos.  

É destacado que 10% dos pacientes apresentaram sintomas gastrointestinais isoladamente sem manifestações respiratórias e retardo no estabelecimento diagnóstico de COVID-19. 

Os autores concluem que sintomas digestivos e alterações hepáticas não são incomuns em pacientes com COVID-19 e especial atenção deve ser devotada a este grupo de pacientes. 

Mao R et al. Lancet Gastroenterol Hepatol 2020;5:667-678. 

O uso de Inibidores da Bomba Protônica (IBPs) aumenta o risco de COVID-19 

Em um trabalho recém-publicado no American Journal of Gastroenterogy pelo Departamento de Medicina do Cedars-Sinai Medical Center, Los Angeles, USA, foi observada a relação entre o uso de IBPs  e positividade para COVID-19.  Segundo as conclusões, o uso de IBPs, particularmente em dose diária dobrada, está associado a maior probabilidade de positividade de teste para COVID-19, mesmo se consideradas variáveis clínicas, sóciodemográficas e estilo de vida. 

O estudo populacional envolveu 53.130 pacientes on-line entre 3 de maio de 2020 a 24 de junho de 2020 em comunidade norte-americana.  Dentre os casos pesquisados, 3.386 pacientes relataram positividade para COVID-19, tendo sido observado um aumento significativo da positividade naqueles que ingeriam IBPs uma ou duas vezes por dia. Não foi observado risco mais elevado dentre os pacientes que ingeriam antagonistas dos receptores H2 da histamina. 

Concluem que os resultados da investigação não significam que os pacientes devam necessariamente cessar o uso dos IBPs. Esses fármacos têm ação comprovada e, em muitos casos, os benefícios superam os riscos. Como sempre, a decisão sobre quando e como modificar a dosagem de IBP deve se basear em cuidadosa avaliação do risco/benefício para cada paciente. Como qualquer outra medicação, a menor dose efetiva deve ser empregada quando houver indicação clínica e, quando apropriado e consistente com as diretrizes da melhor prática médico/terapêutica, os inibidores dos receptores da histamina podem ser considerados como alterativa terapêutica  para condições ácido-relacionadas. 

Almario CV et al. Increased  risk of COVID-19 among users of proton pump inhibitors.  Am J Gastroenterol, 2020. Preprint on-line. 

Dr. Joaquim Prado P Moraes-Filho

Professor livre-docente de gastroenterologia – Fac .Med. Univ. São Paulo (FMUSP)

Diretor de comunicação – FBG