Alterações intestinais (incluindo isquemia) em pacientes com COVID-19.

Trabalho recentemente publicado na revista Radiology destaca aspectos intestinais nesses pacientes.   Investigadores do Massachusetts General Hospital, Boston, EUA, conduziram um estudo retrospectivo que incluiu 412 pacientes testados positivamente para síndrome respiratória aguda grave-coronavírus 2 e que foram consecutivamente admitidos em centros quaternários de atenção médica.  A amostra incluiu 241 homens (58%) e 171 mulheres (42%) com idades médias de 57 anos.  Desses pacientes, 136 (33%) foram internados em UTIs. A proporção de pacientes que apresentaram pelo menos um sintoma gastrintestinal inicialmente foi de 34% (142/412), sendo acompanhados após a admissão por 16,8 dias (média: 11-25).

Conforme a indicação, foram realizados exames de imagem como ultrassons (44), tomografias computadorizadas (42) e (1) ressonância magnética. Os achados encontrados incluíram espessamentos e indicações de isquemia como pneumatose e presença de gás no sistema portal.

Segundo os investigadores, as anormalidades de COVID-19 foram mais comuns nos pacientes mais graves, na UTI.  Em dois casos em que foi realizada ressecção intestinal, observou-se isquemia com áreas de necrose.  Determinados achados foram típicos de isquemia intestinal, algumas mais graves com pequenos coágulos nas áreas de necrose.  É certo que a isquemia intestinal pode ocorrer por outras razões, mas como COVID-19 pode levar à coagulação e danos aos pequenos vasos, deve ser considerado nesses casos.

Trata-se de um estudo preliminar que indica um caminho provável para investigações mais aprofundadas.

Referência:
www.rsna.org/news/2020/May/COVID-19-Bowel-Abnormalities

Aspectos gastrointestinais da COVID-19

Estudos de metanálise e dados de pacientes destacam prevalência de manifestações gastrintestinais e eliminação de fezes contaminadas por vírus. Os sintomas predominantes da COVID-19 são respiratórios, mas manifestações gastrintestinais também podem ocorrer e eventualmente não serem lembradas.  Investigadores de Hong Kong analisaram dados clínicos de um coorte de pacientes com COVID-19 e realizaram revisão sistemática e metanálise em 60 estudos com dados sobre sintomas gastrintestinais (4243 pacientes) e 11 estudos com dados sobre RNA viral nas fezes.

Em 59 pacientes analisados (idade média: 58), 25% apresentaram sintomas gastrointestinais, mais comumente diarreia e dor abdominal. Embora todos os pacientes tenham tido febre, 54% deles não apresentaram tosse. O RNA viral COVID-19 nas fezes foi positivo em 15% na apresentação inicial de todos os 59 casos e em 9% dos pacientes sem manifestações digestivas.

Na metanálise a prevalência de manifestações gastrintestinais foi de 18%, sendo anorexia o sintoma mais comum (27%), seguido por diarreia (12%), náuseas/vômitos (10%) e dor abdominal (10%). A prevalência de manifestações digestivas como um todo foi de 17% em pacientes com doença grave comparada com 12% naqueles com formas mais brandas, tendo se apresentado de modo semelhante em adultos, crianças e mulheres grávidas. A frequência concomitante de positividade do RNA viral nas fezes e amostras do trato respiratório foi de 48%.   Em estudos que descrevem testes seriados, 70% dos pacientes apresentaram fezes com RNA positivo para COVID-19 mesmo após os testes respiratórios terem se negativado.

Comentário sobre o editorial New England Journal of Medicine  

Numerosos estudos têm descrito experiências clínicas com COVID-19.  Gastroenterologistas assim como outros clínicos devem estar a par de que sintomas gastrintestinais são comuns (e podem se constituir na apresentação clínica) e que a ocorrência viral nas fezes se sucede durante o curso da enfermidade (e pode persistir após o mesmo).  A prevenção da transmissão fecal-oral do COVID-19 é, portanto, crucial.

Referência:
NEJM Journal watch. jwatch.org/na51324/2020/04/09/gastrointestinal-aspects-covid-19

Dr Joaquim Prado P Moraes-Filho

Professor Livre Docente – Fac Med USP

Diretor Comunicação – FBG