Clínicos devem estar atentos ao fato de que a hepatite não-ictérica aguda pode ser a apresentação inicial de COVID-19 antes do desenvolvimento de sintomas respiratórios. Os pacientes com fatores de risco para a enfermidade que apresentam inicialmente manifestações de hepatite aguda devem ser isolados para se submeterem imediatamente aos testes para COVID-19.
No caso em pauta, mulher de 59 anos de idade procurou o hospital (Hemptead, NY, E.U.A.) por apresentar a urina escura. Negava tosse, dor de garganta, dispnéia, diarréia, náuseas, vômitos e dor abdominal. História de bem controlada imunodeficiência viral (CD4 499), hipertensão, hiperlipemia, doença de Graves (hipertireioidismo) e paralisia facial esquerda secundária a infecção actinomicótica prévia. Temperatura corporal de 37,2oC, sem outros sinais ao exame físico.
Os seguintes exames sorológicos foram negativos : ultrassonografia abdominal, hepatite A, B, C, E, Cytomegalovirus, Epstein-Barr e painel viral respiratório. Tambem negativas hemoculturas e marcadores auto-imunes. Os seguintes exames achavam-se alterados : AST = 1230 ui/l (n<50); ALT = 697 ui/l (n= <50); FA = 141 ui/l (n<125); ; albumina sérica = 3,1 g/dl (n> 3,5).
No decorrer da internação, cerca de 20h após a admissão, a temperatura corporal passou a 39oC e a oximetria 94%. RX de tórax revelou opacidades intersticiais bilaterais e amostras nasofaríngeas para PCR SARS-CoV foram positivas. Foi a seguir iniciado um curso terapêutico com hidroxicloroquina 200 mg 2x/dia e a paciente teve alta hospitalar no 8o dia com exames ainda elevados mas tendendo à normalidade.
Tendo em vista a peculiaridade do caso, os autores concluem que estudos observacionais são necessários para determinar a frequência dessa apresentação bem como a ocorrência de anormalidades leves/moderadas nas provas hepáticas durante a evolução da atual pandemia.
Ref.- Wander P et al. COVID-19 presenting as acute hepatitis. Am J Gastroenterol 2020;115:941.
COVID-19 com manifestações colônicas
A pandemia por COVID-19 já incluiu mundialmente mais de um milhão de infecções e mais de 50.000 mortes documentadas desde seu início em dezembro de 2019. Tipicamente os pacientes se apresentam com febre, dor de garganta, tosse sêca, dispnéia, mal estar e mialgia. Manifestações gastrintestinais estão presentes em 3% – 50% dos casos, incluindo náuseas, vômitos, dores abdominais e diarréia. Os autores descrevem tres casos de pacientes masculinos (idades: 38, 74, 55) tratados por pneumonia por COVID-19 associada a colite ou íleo-colite.
Os sintomas digestivos mais comumente descritos são: anorexia, diarréia, vômitos, constipação e dor abdominal. Esses sintomas podem preceder ou serem acompanhados de febre, fadiga, mialgia e manifestações respiratórias. Quando comparados aos pacientes sem sintomas digestivos, estes costumam ter um período maior até a entrada hospitalar, provavelmente pela ocorrência de sintomas mais leves ou eventualmente falta de conhecimento das manifestações gastrintestinais de COVID-19. Os sintomas gastrintestinais podem, entretanto, ocorrer precomente como nos casos aqui descritos.
Quando o swab nasofaríngeo se apresenta negativo nos pacientes que se apresentam com manifestações gastrintestinais e existe suspeita de COVID-19, deve ser considerado o exame para análise de presença de sangue nas fezes. Como se sabe, a endoscopia alta e colonoscopia geram aerossóis com riscos para a equipe médica e de enfermagem e por isso são limitadas aos pacientes com sangramento gastrintestinal importante ou obstrução esofagiana por corpo estranho.
Os casos em pauta apresentaram-se com febre, dor abdominal e diarréia. Tosse e náuseas tambem estiveram presentes. O envolvimento colônico foi observado à tomografia abdominal computadorizada, tendo sido medicados com hidroxicloroquina, azitromicina e sulfato de zinco que, embora em uso, demandam ensaios clínicos rigorosos para caracterizar ou não a eficácia terapêutica nos casos de COVID-19.
Ref.- Sattar Y et al. Three cases of COVID-19 Disease with colonic manifestations. Am J Gastroenterol 2020;115:948-950.
COVID-19: quando teremos uma vacina ?
Os autores discutem as reais perspectivas da disponibilidade da vacinaçào para COVID-19. À medida que as vacinas para COVID-19 entram na fase 3 dos ensaios clínicos, o entusiasmo pelas novas tecnologias sofisticadas e inovadoras atualmente utilizadas necessita ser substituido pela consideração das efetivas ações e mensagens que irão induzir a confiança entre os médicos e pacientes. Embora grandes investimentos tenham sido feitos no desenvolvimento de vacinas seguras e efetivas, é importante lembrar que é o ato de vacinação em si que previne a doença e salva vidas.
Recentemente foram divulgados pelo FDA (Food and Drug Adminstration) as diretrizes para os produtos candidatos à vacina, embasados cientificamente e indicando que não devem ser assumidos compromissos quando se trata de avaliar eficácia e segurança. Esse compromisso necessita ser periodicamente lembrado particularmente nas provas de teste vacinal e processos de aprovação, sempre suportados por absoluta transparência. Os médicos e o público devem ter acesso fácil aos materiais em que os estudos disponíveis são divulgados assim como as apresentações relacionadas a segurança e eficácia. Os planos do FDA e do CDC (Center for Diseases Control) para a observação de uso a longo prazo após a licença das vacinas, deverão também ser visíveis, particularmente aos profissionais de saúde que são peças essencias para o sucesso do esforço conjunto.
Dados de testes para anticorpos sugerem que cerca de 90% da população é suscetível ao COVID-19. Aceitando que 60 a 70% da população deveria ser imune como resultado da infecção natural ou vacinação, para finalizar a pandemia alcançando a proteção comunitária (também chamada “imunidade de rebanho”), cerca de 200 milhões de norte-americanos e 5,6 bilhõesde pessoas em todo o mundo deverão estar imunes. A possibilidade de que esse processo leve anos para alcançar a cobertura vacinal necessária levanta questões difíceis sobre as prioridades e o acesso doméstico e mundial.
Nos Estados Unidos e em muitos outros países as novas vacinas e recomendações de vacinação são raramente liberadas com informações claras e substanciais para o público, assim como os recursos educativos envolvidos no processo. O fato é que já ocorre atualmente um verdadeiro fluxo de más informações nas midias sociais e de ativistas anti-vacinação sobre as novas vacinas que poderão ser lançadas para COVID-19. Por outro lado, a ser verdade o que as pesquisas recentes sugerem, que cerca da metade dos norte-americanos aceitariam a vacina, isto necessitará de recursos substanciais, além de suporte ativo e político-partidário, para alcançar os níveis necessários para alcançar níveis satisfatórios de imunidade.
É importante considerar que tem sido demonstrado que médicos, enfermagem e farmacêuticos permanecem sendo os profissionais de maior credibilidade junto ao povo em geral. O envolvimento ativo, extenso e contínuo por esse pessoal é essencial para alcançar aceitação elevada de vacinas para COVID-19 afim de que a sociedade possa retornar às condições pré-pandemia. Nesse caso, em todo o mundo os professionais de saúde necessitam estar muito bem informados e constituir importante endosso da vacinação.
Uma resposta mais completa à questão mais comum é, portanto, a seguinte. “Nós teremos uma vacina para COVID-19 segura e efetiva quando os estudos científicos, processos de engajamento, comunicação e esforços pró educação durante essa fase inicial de estudos clínicos tenham construido sobretudo segurança. Isso resultará no entendimento, suporte e aceitação das recomendações de vacinação pela vasta maioria do público”. Neste momento, todos os esforços devem se dirigir para engajar as diferente comunidades no processo de vacinação para COVID-19, como estratégias de educação, mensagens -chave e material apropriado e adequado para médicos e público.
Ref. Bloom BR et al. When will we have a vaccine? – understanding questions and answers about Covid-19 vaccination. N Engl J Med.Org 2020. Acesso 10/09/2020.
Joaquim Prado P Moraes-FilhoProfessor Livre Docente. Fac Med USPDiretor de Comunicação – FBG