PREVALÊNCIA DE SINTOMAS GASTRINTESTINAIS NOS CASOS DE SÍNDROME RESPIRATÓRIA AGUDA GRAVE POR INFECÇÃO CORONAVÍRUS 2. RESULTADOS DE ESTUDO GASTROINTESTINAL MULTINACIONAL PROSPECTIVO CONTROLADO – COVID-19

O curso clínico da síndrome respiratória aguda grave por COVID-19 (SARS-CoV-2), conhecida como doença por COVID-19, pode se apresentar de modo variado, desde casos assintomáticos a outros com rápida progressão para maior gravidade e risco de vida. A doença grave é caracterizada por hipoxemia, insuficiência respiratória e eventualmente falência de múltiplos órgãos.  

SARS-CoV-2 pode também comprometer o aparelho digestivo para o qual tem acentuado tropismo.  O envolvimento digestivo costuma ser associado a náuseas, vômitos, dor abdominal e diarréia. A presença fecal de SARS-CoV-2 RNA em aproximadamente 50% dos pacientes  dos pacientes com COVID-19 confirma que o trato digestivo é um dos alvos do vírus e levanta preocupações sobre a possível propagação da enfermidade por via oral-fecal.

O presente relevante estudo, multicêntrico controlado envolveu numerosas universidades de 12 diferentes países (Itália, Rússia, Romania, Bangladesh, Espanha, Turquia, Sérvia, Macedônia, Israel, Índia, Cyprus, Malásia). O trabalho foi endossado pela Sociedade Europeia de Gastroenterologia, Sociedade Europeia de Neurogastroenterologia e Motilidade e Fundação Roma.

Com o objetivo de determinar a prevalência de sintomas gastrintestinais  em pacientes com COVID-19 em comparação com um grupo controle assintomático negativo para COVID-19, foram analisados 2.026 pacientes adultos (⋝18/⋜85 anos de idade) hospitalizados. Foram também avaliados os fatores de risco para o desenvolvimento de sintomas gastrintestinais  e a persistência de sintomas após um mês da avaliação inicial.

Os pacientes com e sem o diagnóstico de COVID-19 foram recrutados na admissão hospitalar e questionados quanto aos sintomas gastrintestinais na entrada e após 01 mês. Foi utilizado o Questionário de Escala de Sintomas devidamente validado.

Um total de 871 pacientes (575 COVID+ e 296 COVID-) foram incluídos na análise primária.  Os sintomas gastrintestinais ocorreram mais frequentemente nos pacientes com COVID-19 (59,7%; 343/575 pacientes) do que no grupo controle (43,2%; 128/296 pacientes) p<0,001).  Quando comparados aos controles, os pacientes com COVID-19 se queixaram de maior prevalência ou intensidade de náuseas, diarréia, fezes amolecidas, e urgência.  Após o seguimento de 01 mês foi observada redução na presença ou intensidade dos sintomas gastrintestinais nos pacientes COVID-19 em comparação à admissão hospitalar.  Nos controles as náuseas permaneceram aumentadas.   Os fatores associados significativamente com a persistência de náuseas nos casos de COVID-19 foram:  sexo feminino, índice de massa corporal elevado, presença de dispnéia e níveis aumentados de proteína-C reativa.

O estudo demonstra evidência de que a infecção SARS-CoV-2 está associada com diarréia, náuseas e outros sintomas gastrintestinais que incluem amolecimento da massa fecal e urgência para evacuação quando comparados à população controle. As pacientes do sexo feminino com febre, corrimento nasal, anosmia, cefaléia, níveis de AST aumentados e o relato de ingestão prévia de antibióticos nos 3 meses anteriores à admissão hospitalar constituiram riscos aumentados de manifestações gastrintestinais.  Os pacientes COVID-19 com sintomas gastrintestinais apresentaram frequências maiores de envolvimento sistêmico, incluindo febre, fadiga, mialgia, dispnéia, corrimento nasal, cefaléia, anosmia e disgeusia.  A presença de sintomas gastrintestinais, contudo, não elevou a frequência de admissões à UTI nem tampouco a mortalidade. 

Conclui-se que a prevalência de sintomas gastrintestinais em pacientes hospitalizados com COVID-19 é maior do que previamente descrito. Os sintomas sistêmicos e respiratórios são muitas vezes associados com queixas gastrintestinais.   Náuseas podem persistir após a resolução da infecção de COVID-19.

Marasco G et al. Prevalence of Gastrointestinal Symptoms in Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2 Infection : Results of the Prospective Controlled Multinational GI-COVID-19 Study. Am J Gastroenterol 2022; 117:147-157.  htpps://doi.org/10.14309/ajg.0000000000001541.

SUPLEMENTAÇÃO DE VITAMINA D E RISCO DE COVID-19: ESTUDO COORTE BASEADO POPULACIONAL

O objetivo do presente trabalho realizado em Barcelona, Espanha, foi analisar as associações entre a suplementação de colecalciferol ou calciferol e os níveis séricos de 25-hidroxivitamina D (25ODH) e desfechos de COVID-19 em uma extensa população.

Com esse propósito, todos os residentes em Barcelona maiores de idade (n= 4,6 milhões) que haviam recebido suplementação de colecalciferol ou calcifediol no período de abril de 2019 a fevereiro de 2020 foram comparados com controles não-medicados, com pontuação de propensão correspondente.

As variáveis analisadas foram: infecção por SARS-CoV-2, casos graves de COVID-19 e mortalidade por COVID-19 que ocorreram durante a primeira onda da pandemia.  Foram também observados como co-variáveis: dados demográficos, ocorrência de comorbidades, níveis séricos de 25 OHD e tratamentos farmacológicos concomitantes.  As associações entre a utilização de colecalciferol e calcifediol e os resultados foram analisados empregando sistema Cox de regressão proporcional multivariada.

A suplementação de colecalciferol (n=108.343) foi associada a leve proteção de infecção por SARS-CoV-2  (n=4352 SARS-CoV-2 [4,0%] vs 9142/216.686 [4,2%] em controles; HR 0,95[CI 95% 0,91-0,98], p=0,004).  Os pacientes em tratamento com colecalciferol que alcançaram níveis > 30 ng/ml de 25OHD apresentaram menor risco de infecção por SARS-CoV-2, menor risco para COVID-19 grave e menor risco de mortalidade do que os pacientes deficitários e não suplementados por 250HD  (56/9474 [0,6%] vs 96/7616 [1,3%]; HR 0.66 [CI 95% 0,46-0,93], p=0,018).  Em todo o coorte analisado, o uso de calcifediol (n-134.703) não foi associado com redução de risco  de infecção por SARS-CoV-2 ou mortalidade.  Os pacientes em tratamento com calcifediol, entretanto, que alcançaram níveis de de 25ODH > 30 ng/ml apresentaram menor risco de infecção por SARS-CoV-2, menor risco de infecção grave por COVID-19 e menor mortalidade quando comparados aos pacientes com deficiência de 25OHD  que não receberam suplementação de vitamina D (88/16272 [0,5%] vs 96/7616 [1,3%]; HR 0,56 [CI 95% 0,42-0,76]; p<0,001).

Os autores concluem que, nesse estudo populacional amplo, foi observado que a suplementação de pacientes com colecalciferol ou calcifediol, alcançando níveis de 25OHD > 30 ng/ml, foram associados com melhores desfechos de COVID-19. 

Oristrell J et al. Vitamin D supplementation and COVID-19 risk: a population-based, cohort study. J Endocrinol Invest 45;167-179, 2022. https://doi.org/10.1007/s40618-021-01639-9.

Compilação :

Joaquim Prado P Moraes-Filho

– Professor Associado de Gastroenterologia. – Fac.Med.USP

– Diretor Comunicação – FBG